quinta-feira, 28 de março de 2013

Cultura, Política e Poder

A cultura não depende da política, pelo menos não deveria , ainda que isso seja inevitável nas ditaduras, sobretudo nas ideológicas ou religiosas, nas quais o regime se sente autorizado a ditar as normas e  a estabelecer cânones dentro dos quais a vida cultural se deve desenvolver, sob uma vigilância do Estado empenhado em que ela não se afaste da ortodoxia que serve de apoio àqueles que governam. O resultado deste controlo, sabemo-lo, é a progressiva conversão da cultura em propaganda, isto é, na sua deliquescência por falta de originalidade, espontaneidade, espirito crítico e vontade de renovação e experimentação formal.

Numa sociedade aberta, ainda que mantenha a sua independência da vida oficial, é inevitável e necessário que a cultura tenham relações e intercâmbios. Não só porque o Estado, sem restringir a liberdade de criação e de crítica, deve apoiar e propiciar atividades culturais -- na preservação e promoção do património cultural, acima de tudo-- como também porque a cultura deve exercer uma influência sobre a vida política, submetendo-a a uma avaliação crítica contínua e inculcando-lhe valores e formas que a impeçam de se degradar.

Na civilização do espetáculo, infelizmente, a influência que a cultura exerce sobre a politíca, em vez de lhe exigir que mantenha certos padrões de excelência e integridade, contribui para a deteriorar moral e civicamente, estimulando o que possa nela haver de pior, por exemplo, a simples farsa. Todos vimos como, ao ritmo da cultura dominante, a politica foi substituindo cada vez mais as ideias e os ideais, o debate intelectual e os programas, pela mera publicidade e pelas aparências. Consequentemente, a popularidade e o êxito conquistam-se não tanto pela inteligência e pela probidade, mas sim pela demagogia e pelo talento histriónico.


Assim dá-se o curioso paradoxo de que, enquanto nas sociedades autoritárias é a política que corrompe e degrada a cultura, nas democracias modernas é a cultura -- ou aquilo que ursupa o seu nome -- o que corrompe e degrada a política e os políticos.

Mário Vargas Llosa

A Civilização do Espetáculo