sábado, 3 de abril de 2010

Saramago e todas as Putas (só aquelas que pariram politicos)



"Regressados de uma viagem à Argentina e Bolívia, os meus cunhados María e Javier trazem-me o jornal Clarín de 30 de Agosto.

Aí vem a notícia de que vai ser apresentada ao Parlamento peruano uma nova lei de turismo que contempla a possibilidade de entregar a exploração de zonas arqueológicas importantes, como Machu Picchu e a cidadela pré-incaica de Chan-Chan, a empresas privadas, mediante concurso internacional.

Clarin chama a isto "la loca carrera privatista de Fujimori". O autor da proposta de lei é um tal Ricardo Marcenaro, residente da Comissão de Turismo e telecomunicações e Infra-Estrutura do Congresso peruano, que alega o seguinte, sem precisar da tradução: " En vista de que el Estado no ha administrado bien nuestras zonas
arqueológicas – qué pasaría si las otorgaramos a empresas especializadas en otros países con gran efectividad?"

A mim parece-me bem.

Privatize-se Machu Picchu, privatize-se Chan Chan, privatize-se a Capela Sistina, privatize-se o Pártenon, privatize-se o Nuno Gonçalves, privatize-se a Catedral de Chartres, privatize-se o Descimento da Cruz, de Antonio da Crestalcore, privatize-se o Pórtico da Glória de Santiago de Compostela, privatize-se a Cordilheira dos Andes,

privatize-se tudo,
privatize-se o mar e o céu,
privatize-se a água e o ar,

privatize-se a justiça e a lei, 
privatize-se a nuvem que passa,
privatize-se o sonho,

sobretudo se for diurno e de olhos abertos. 

E, finalmente, para florão e remate de tanto privatizar,
privatizem-se os Estados,
entregue-se por uma vez a exploração deles a
empresas privadas, mediante concurso internacional.

Aí se encontra a salvação do mundo... 

E, já agora,
privatize-se também a puta que os pariu a todos."

José Saramago


Cadernos de Lanzarote - Diário III, págs. 147/8




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sexta-feira, 2 de abril de 2010

Déjà Vu

Ao ouvir José Sócrates parece que estamos a rever um daqueles filmes do assustador neo-realismo português, Sócrates não nos responde com a realidade, nem sequer a descreve, foge dela a sete pés. Em alternativa, a única que nos concede, imagina um mundo e trata de nos descrever a referida fantasia agora com contornos de romance tecnológico e termina sempre com a inevitável lição moral aos que o invejam, aos que não percebem certamente por teimosia ou pura estupidez, que o futuro será maravilhoso.