Frequentamos as pessoas durante anos, por vezes dezenas de
anos, habituamo-nos pouco a pouco a evitar as questões pessoais e os assuntos
realmente importantes; mas conservamos a esperança de mais tarde, em
circunstâncias mais favoráveis...
...podermos justamente abordar esses assuntos, essas questões; a perspectiva indefinidamente afastada de um modo de relação mais humano e mais completo, nunca se apaga por completo, simplesmente porque é impossível, porque nenhuma relação humana se acomoda a um quadro definitivamente estreito e rígido.
...podermos justamente abordar esses assuntos, essas questões; a perspectiva indefinidamente afastada de um modo de relação mais humano e mais completo, nunca se apaga por completo, simplesmente porque é impossível, porque nenhuma relação humana se acomoda a um quadro definitivamente estreito e rígido.
Mantém-se a perspectiva, portanto, duma relação “autêntica e
profunda”; mantém-se durante anos, por vezes dezenas de anos, até que um
acontecimento definitivo e brutal (em geral da ordem dum óbito) venha fazer-nos saber que é demasiado
tarde, que essa relação “ autêntica e profunda” cuja imagem acariciámos não
teria lugar, também ela, não mais lugar que as outras.
O conhecimento, sim…
Há um desejo de conhecimento que permanece.
É uma coisa curiosa o desejo de conhecimento…Muito poucas
pessoas o têm, bem se entende, até mesmo entre os investigadores; na maior
parte dos casos contentam-se em fazer carreira, bifurcam rapidamente para o
administrativo; e todavia, trata-se dum desejo terrivelmente importante na
história da humanidade. Poderíamos uma fábula em que um grupo muito reduzido de
homens – no máximo algumas centenas de pessoas à superfície do planeta –
persiste com obstinação uma actividade muito difícil, muito abstracta,
absolutamente incompreensível para os não iniciados.
Esses homens continuam para sempre a ser desconhecidos para
o resto da população; não conhecem nem o poder, nem a fortuna, nem as honras;
ninguém é sequer capaz o prazer que a sua pequena actividade lhes proporciona.
E, contudo, são a força mais importante do mundo, e isso por uma razão muito
simples, uma simples pequena razão; são detentores da chave da certeza
racional.
Tudo o que declaram verdadeiro é mais cedo ou mais
tarde reconhecido como tal pelo conjunto da população; não conhecem nem o
poder, nem a fortuna nem as honras; ninguém é sequer capaz o prazer que a sua
pequena actividade lhes proporciona.
Nenhuma força económica, politica, social
ou religiosa é capaz de enfrentar a evidência da certeza racional. Pode
dizer-se que o Ocidente se interessou além de toda a medida pela filosofia e
pela política, que se bateu duma maneira perfeitamente insensata em torno das
questões filosóficas ou políticas; podemos dizer também que o Ocidente amou
apaixonadamente a literatura e as artes; mas, na realidade, nada terá tido
tanto peso na sua história como a necessidade de certeza racional. O Ocidente
terá acabado por sacrificar tudo a esta necessidade de certeza raciona; a sua
religião, a sua felicidade, as suas esperanças e em última análise a sua vida.
É uma coisa que teremos de ter presente se quisermos fazer um juízo de conjunto
sobre a civilização Ocidental.
O que decide do valor duma religião é a qualidade da moral
que ela permite fundamentar.
Mas acabo por pensar que as religiões são acima de tudo tentativas de explicação
do mundo; e nenhuma tentativa de explicação do mundo pode manter-se e
contrariar a necessidade de certeza racional.
A prova matemática, o
procedimento experimental são conquistas definitivas da consciência humana.
Bem sei que os factos parecem contradizer-me, bem sei que o
islão – de longe a mais estúpida, a mais falsa e a mais obscurantista de todas
as religiões – parece ganhar terreno na actualidade: mas isso não passa dum
fenómeno superficial e transitório; a longo prazo, o islão está condenado ainda
mais seguramente do que o cristianismo.
Porque se deve lêr Michel Houllebecq