quarta-feira, 18 de março de 2015

UMA NOVA ERA DAS TREVAS?


O Renascimento, o Iluminismo, ciência e tecnologia, e o reconhecimento dos direitos do homem, são os valores de estado (ocidentais) que têm dominado o mundo nos últimos 500 anos. Ao longo dos últimos 200 anos, a visão Anglo – Americana de economia: assumiu forma e através da: industrialização; a democracia representativa liberal; colonização patrocinado pela inovação e crescimento económico. Estes elementos acabaram por se fundir na globalização económica.

O sismógrafo regista agora algo mais sinistro do que fissuras; desafios a praticamente todos estes elementos-chave estão na base do movimento descontrolado que a agulha indica.



O macho alfa da ordem mundial, os EUA, não quer nem é capaz de defender o sistema de controle. Ele deixou de ser a nação indispensável. A centelha de idealismo desapareceu, forçando os EUA a voltar ao poder bruto da força, apesar de toda a sua conversa sobre o democracia, liberdade e tolerância.

A autoridade moral desapareceu e já não está presente e disponível para apoiar e fundamentar as políticas dos EUA e suas intervenções.

O mal-estar começa em casa. Os norte-americanos já não confiam no seu próprio modelo e não expressam vontade de "exportação". A desigualdade está a crescer. A família, importante para a educação dos filhos, está gradualmente a ser desviada; filhos de pais solteiros têm menos experiência de convívio com outras pessoas. Juntos, esses "terramotos" sociais aniquilam coerência e uniformização, propósitos comuns e consenso, comprometendo assim por todo o mundo o modelo norte-americano - como o objectivo final ou mais simplesmente ainda como uma norma a ser copiada e adoptada.  Ainda que com alguns ajustes - perdeu totalmente o seu encanto. O modo de vida americano ainda é atraente, mas nem o sistema político norte-americano nem o modelo económico evocam sentimentos semelhantes.


A ausência de autoridade moral, abriu a porta para uma enxurrada de novas ideias, novas ideologias e modelos novos, todos eles adulterações, tapando buracos, e contestando a ordem mundial existente.

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A globalização da economia está a ser desafiada pelo nacionalismo económico. A globalização económica fez maravilhas e ainda são palpáveis os crescimentos económicos que proporciona, maiores do que em qualquer outro modelo. No entanto contém em si vários problemas.

A globalização económica estripa a identidade cultural enraizada no nacionalismo do povo, e é sentida como uma ameaça aos costumes, à religião e à cultura familiar, normas essenciais e tradicionais para a vida diária. As pessoas têm estado, até agora, dispostos a sacrificar uma parte de sua identidade cultural, porque as recompensas desta globalização económica, eram grandes e tangíveis. Com a queda de crescimento global a pôr um fim a este ciclo e com políticas para a sustentar, agora, à sombra dum crescimento menor, a alteração e o termino de muitas regras nacionais no processo de alienar para permitir o controle político da economia – as pessoas sentem que o sistema não é delas nem para elas, mas sim configurado, executado e controlado por "alguém. '

Por conseguinte, a concentração de capital e controle da economia sofreu uma mudança dramática ao longo das duas últimas décadas. O número de instituições financeiras, incluindo os bancos, diminuiu, dando a essas instituições  - e, implicitamente, às pessoas que controlam essas instituições - um maior poder sobre a economia global como nunca antes foi visto. 147 empresas directa ou indirectamente controlam 40 por cento das transacções comerciais globais.

A ligação e a interactividade entre o empresário e os trabalhadores que vivem na mesma comunidade desapareceu. A propriedade torna-se cada vez mais impessoal e opaca e é distorcida por fundos e outros produtos financeiros através de uma agenda de lucro a curto prazo - o jogo de magia financeira – que tornam desinteressante a construção dum emprego de longa duração que preste actividade genuína.

É perturbante que estudos e sondagens mostrem de forma inequívoca, como as estratégias empresariais são construídas deliberadamente para evitar os impostos e, se isso não for possível, para confundir, minimizam receitas e lucros, para diminuir os impostos; muitas nações não recebem nenhuma receita fiscal das empresas multinacionais que aí operam a todo vapor.

O grau de desigualdade está a crescer. Análises recentes revelaram que as 138 pessoas mais ricas do planeta possuem uma riqueza maior doque os 3,5 biliões de pessoas mais pobres juntas. Outra pesquisa revela que muito em breve apenas 1% da população mundial, os mais ricos, possuirão mais riqueza que todo o resto da humanidade junta.

As pessoas chegam facilmente à conclusão que se um crescimento maior proporciona mais riqueza às pessoas já muito ricas, então um modelo económico com um crescimento menor mais equitativamente distribuído poderá ser melhor para elas.



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Extremismo versus compromisso e consenso pode não ser nada de novo numa perspectiva histórica, mas desde 1945 até uma ou duas décadas atrás o compromisso e o consenso reinaram em grande escala sem contestação. O fanatismo ao dar à luz o nazismo, o fascismo e o comunismo pode explicar a razão porque a visão do mundo ocidental se moveu rápida e fortemente na direcção do compromisso e do consenso.

Pode ser que seja exactamente esta prevalência - este sucesso - que deu origem à reunião da oposição em torno do extremismo muitas vezes usando (abusando?) da Religião. Do ponto de vista ocidental, tomou a forma de fanáticos muçulmanos, mas não é um fenómeno exclusivo do Islão.

 O Wahhabismo  é a força motivadora (e motriz)  por trás do terrorismo atribuído ao Islão, mas conta com menos de 10 milhões de pessoas. O fundamentalismo cristão rejeita a teoria da evolução e como consequência o papel fulcral da ciência e tecnologia, nas sociedades modernas. Não matar e a não-violência são centrais no budismo mas há notícias de monges budistas que incutem ódio contra os muçulmanos. O extremismo hindu (nacionalismo) é uma força a ser tomada em conta na Índia. É difícil escapar à observação de que a religião é refém do extremismo.

A urbanização produziu uma classe de falhados sociais. Eles têm dificuldade em aceitar as suas novas condições e é ainda mais difícil de admitir que isso pode ser devido a um sistema de educação inadequada e que uma estrutura económica petrificada possa resistir à combinação de modernização e desenvolvimento. Em vez disso, eles culpam os estrangeiros e o modelo económico ocidental. Daí até procurar um refúgio na religião - pelo menos para alguns deles - não é um grande passo. O próximo passo, na forma de violência como justificação, requer a defesa da identidade, que é lhes oferecida por fanáticos religiosos que citam textos religiosos - muitas vezes fora de contexto.

Três factores explicam por que esta oscilação de causa  efeito é mais visível entre os muçulmanos  do que entre outros grupos religiosos.

Em primeiro lugar, o mundo muçulmano está geograficamente perto da Europa. O cristianismo e o islamismo têm se enfrentado ao longo dos séculos. Desde a industrialização que uma grande parte do Médio Oriente e do mundo árabe se tornou parte dos impérios britânico e francês. Mas os orgulhosos tempos de outrora, em que os papéis eram opostos não foram esquecidos, e são a razão da crescente animosidade e raiva à procura duma explicação, e mais importante ainda, como restabelecer uma relação mais igualitária.

Em segundo lugar, o mundo muçulmano e o islamismo são especiais: quase todas as outras culturas saudaram a cultura ocidental ou aspectos da mesma. O Islão foi ficando como a única "visão de mundo" teocrático fundamentalmente diferente, não só da visão de mundo ocidental, mas também do seu laicismo

Os muçulmanos sentiram que eles e a sua religião, tinham um papel especial.

Em terceiro lugar, a imigração dos muçulmanos para a Europa agora corresponde a cerca de quatro por cento e até quase 10 por cento, dependendo do respectivo país que é observado; isto alterou as regras ao jogo. Esses imigrantes constituem um elo entre a cultura europeia (ocidental) e a cultura dos seus países de origem. A integração não vai bem, em parte por causa do crescimento económico mais baixo, muitos deles transformaram-se em falhados sociais que culpam disso os seus países de acolhimento. Eles deambulam com a identidade dividida, entre a sua nova condição e aquela donde eles ou os seus pais vieram. As redes sociais oferecem amplas oportunidades para se relacionarem com outras pessoas em situações semelhantes à procura de respostas. Eles procuram uma identidade.

Alguns deles são seduzidos por fanáticos que os convencem de que as queixas de que estão enfermos são justificadas. A violência contra os opressores (a globalização económica e a visão de mundo ocidental) é pregada pelos extremistas como a única maneira de resolver o dilema. Ataques bem sucedidos provam o ponto que o modelo ocidental é decadente e fraco, aumentando assim a credibilidade da mensagem dos extremistas. A resposta do Ocidente invadindo países muçulmanos acrescenta combustível às chamas, oferecendo aos extremistas os pretextos referentes às cruzadas e à era colonial.

Os terroristas usam (abusam) das religiões para justificar a violência e movem o mundo para um vácuo cognitivo, vazio de valores e normas, o que aumenta o espectro de uma humanidade depravada. 

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As redes sociais podem aumentar a segregação. À primeira vista as redes sociais têm o potencial de poderem melhorar a compreensão mútua entre os povos e o respeito pelos valores, mas uma observação mais minuciosa revela um grave risco para a tolerância e o respeito mútuo.

As pessoas que usam redes sociais tendem a comunicar com os de cultura e valores comportamentais análogos. Eles reforçam-se mutuamente com as suas crenças, promovendo atitudes não comprometedoras, solidificando a noção de que "nós" estamos certos e "eles" estão errados. Estes grupos, em redes refugiam-se nos seus castelos, hospedando aí a sua intelectualidade, ou melhor mentalidade, içando as pontes levadiças, antes que o controle de qualidade da Internet elimine as comunicações culturalmente ofensivas ou incorrectas. Essa era a responsabilidade do chefe editor.
No caso dum pior cenário ele / ela poderia ser responsabilizado - legal ou eticamente. Hoje as declarações mais absurdas podem ser postadas na rede por qualquer um. O perigo é altamente potenciado quando a rede é usada para postar informação que parece séria e factual, mas é na verdade é deliberadamente enganosa.

No mundo de hoje, o indivíduo está exposto à enorme pressão dos vários media através da esmagadora massa de informações recebidas e de convites constantes para interacção  e comunicação e se integrar em redes sociais. Da mesma forma, a globalização económica, através duma vasta gama de bens e serviços força o indivíduo a consumir e a fazer escolhas na sua vida diária, o que pode parecer fantástico, mas embute riscos e incertezas não conhecidas até aqui. Ou seja, quer identidade bem definida, quer as normas das comunidades locais e as normas culturais estabelecidas estão debaixo dum ataque cerrado. O indivíduo reage então recuando de volta ao básico: afinal quem sou eu?

A resposta tem sido a procura e em seguida a adesão a grupos ancorados em valores comuns partilhados. As redes sociais tornam esta solução facilmente acessível à maioria. Um efeito preocupante decorrente é a segregação mais profunda destas sociedades emergentes, com paredes em volta dos seus valores, existentes dentro dos estados nação, que o dividem em grupos de acordo com os diferentes valores de cada cultura.
Antes o Estado nação actuava como um prestador de serviços oferecendo à sua população, estabilidade económica e de segurança social. O menor crescimento na esteira da crise económica priva os Estados nação dos meios financeiros para desempenhar essa função. As pessoas são então deixadas para trás e caem,  a título definitivo, em grupos fora desse enquadramento oficial, para complementar ou substituir o próprio estado como prestador de serviços. Sendo este o caso, eles tornam-se cativos do grupo a que entraram para receberem os serviços de que precisam para ter sucesso. Segue-se uma diminuição na mobilidade social e geográfica.

Em alguns casos, grupos formados por extremistas impedem os membros de sair, e, se necessário através da aplicação das suas próprias leis completamente à parte das leis da comunidade estatal ou local. Torna-se um tudo ou nada. As sociedades paralelas florescem, mas muitas vezes são difíceis de detectar, pois elas não desafiam abertamente o Estado. O resultado é a não lealdade ao Estado e a não identificação  com os outros cidadãos do mesmo estado.

A religião é um candidato óbvio para agregar os valores de grupo, mas está longe de ser o único a unir pessoas e talvez não seja mesmo o valor mais forte. A Cultura duma região ou a unidade geográfica ou política semelhante, como observado nas antigas regiões da Europa (Escócia, Catalunha, Bavaria e Lombardia, para citar alguns exemplos) ressurgem após 200 anos de hibernação. Vários estilos de vida (por exemplo, Gangues de motoqueiros) funcionam da mesma forma.

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A tecnologia reduziu os custos da interacção humana, levando-nos para um mundo veloz de comunicação e interacção entre os seres humanos, mas, na verdade, com muito pouco contacto humano. As pessoas, especialmente os jovens, gastam cada vez mais e mais do seu tempo isolados dos outros seres humanos, mas "ligados" ao seu PC ou qualquer dispositivo que usem para comunicação. O mundo está a tornar-se algo como uma “história em quadradinhos” pois nem aqueles com quem se comunica, nem a pessoa que com eles comunica, compreende ou sente realmente as consequências, porque o que eles vêem são apenas imagens ou textos, mas nunca genuínos seres humanos. O mundo do download e dos jogos transmite a impressão de que é possível desfazer o que aconteceu e começar de novo. Desastres, dor e até mesmo a morte que se abatem sobre os outros, não são sentidas, porque as pessoas cativadas pelo mundo dos dispositivos, não entendem nem sabem o que o mundo real é.

As pessoas inseridas neste mundo não natural tornam-se pouco sensíveis, até mesmo totalmente insensíveis, como corpos calosos, quando confrontados com o sofrimento de Seres Humanos, seus companheiros. A violência, crueldade e terrorismo para com os outros não conta e não podem ser julgadas através duma perspectiva humana. Aparentemente não sentem qualquer inibição para empreender acções que firam outros seres humanos.

Fala-se muito sobre robôs e a inteligênciaartificial, vir a superar os seres humanos, relegando-os a "escravos". Parece mais urgente analisar como os seres humanos se podem transformar em clones de máquinas sem sentimentos erodindo todos os fundamentos humanos.


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Os direitos fundamentais de liberdade têm ganho terreno ao longo das décadas que precederam esta leitura, mesmo que isso não pareça ser a verdade ao lermos os meios de comunicação de massa, principalmente no mundo ocidental, que lamentam o estado de coisas em países que raramente analisam. Uma mistura de liberdade, de direitos fundamentais humanos, liberdade de expressão, e definição de democracia penetra quase todos os escritos e embacia as questões.

Os direitos fundamentais podem ser definidos como a liberdade do direito do cidadão de poder definir o seu próprio perfil cultural “vis-a-vis” com os outros seres humanos e “vis-à-vis” com o Estado - não há ser humano que viva  isolado numa redoma – e  portanto a pergunta é o que pode ser feito e o que pode ser dito, desde que uma pessoa queira continuar a viver nesta sociedade, comunidade ou grupo? O filósofo Inglês John Locke (1632-1704) declarou que a liberdade pressupõe a auto-disciplina. Indivíduos que vão longe demais forçam a um colapso dos valores comuns e partilhados, sem os quais não se pode manter unido o grupo ou comunidade. Quando a vontade do mais forte prevalece sobre os valores, a liberdade é a vítima. O indivíduo fica sem protecção dos outros cidadãos quer tanto através dos valores comuns quer quando todos são iguais e está sujeito à regra do direito conforme a lei.

A tarefa de encontrar os limites e, assim, defender os direitos fundamentais da liberdade recai sobre o indivíduo. Nem o grupo nem a comunidade / sociedade pode resolver este enigma. Comportamento de grupo e valores comuns diminuem (o ideal é abolir) a necessidade da imposição. Quanto menos os valores profundos comuns estão instalados, maior é a probabilidade duma necessidade de supervisão e o controlo entre em escalada - violando os direitos fundamentais de liberdade, e na verdade, transformando-se numa autocracia.

A liberdade de expressão está embutida nos direitos fundamentais da liberdade, desde que a auto-disciplina seja incorporada nos padrões de comportamento, sem a qual, existe o risco de serem inconciliáveis esses dois ideais. Como os acontecimentos têm demonstrado ao longo das precedentes décadas, a liberdade de expressão dentro de grupos ou comunidades, até mesmo de Estados nação, que negligenciam outros valores exteriores levanta a questão de que significa a liberdade de expressão. Se a reacção de grupos com valores diferentes se tornar muito forte, o Estado intervém para evitar conflitos. Se o Estado não intervir, grupos externos podem tomar essa acção por suas próprias mãos para sinalizar que os seus valores foram violados. Em ambos os casos, haverá limites - escritos ou não - para a liberdade de expressão, por mais que isso seja negado. "Se você usar sua liberdade de expressão às nossas custas,  nós, em seguida, temos o mesmo grau de liberdade?" é um contra-argumento.

O conceito de direitos humanos tem um ponto fraco, é difícil de definir e é globalmente visto como um fenómeno ocidental. Para grupos culturais e estados nação que não desejam adoptar os sistema social e político ocidental esta associação torna os direitos humanos pouco apetecíveis, mesmo quando alguns ou muitos dos seus elementos estejam já bem integrados e a prosperar nas suas sociedades. O Ocidente (EUA) teria sido mais sábio e prudente se tivesse falado às outras nações e grupos culturais sobre as virtudes dos direitos humanos, tal como são praticados no Ocidente, em vez de ensinar e tentar "exportar" o modelo, sem querer entender o tempo que levou para criar raízes no mundo ocidental e as enormes diferenças entre o Ocidente e outras regiões com diferentes origens culturais.

A percepção é de que a liberdade não pode ser alcançado sem democracia. Há vários pontos fracos neste ponto de vista. Em muitos países não ocidentais existe cepticismo sobre a democracia como ela é vista no Ocidente e a posição de que a liberdade não pode ser alcançado por qualquer outro regime político não é aceite. A grande maioria quer direitos fundamentais de liberdade, mas está disposta a dar outra hipótese a sistemas políticos alternativos antes de saltar a bordo dum sistema político de que eles sabem muito pouco. Aquilo que aconteceu no Iraque não os seduziu propriamente.

A maioria dos países na Ásia e em África são multiculturais, multi-religiosos e multi-étnicos. Nesses países, o Estado protege as minorias. A democracia com eleições livres podem vir a entregar a uma maioria parlamentar um governo composto apenas por um desses grupos culturais, abrindo assim as portas ao exercício do imperialismo cultural, ou ainda pior, à opressão das minorias. Os defensores da democracia e eleições livres não têm sido capazes de solucionar esta equação e falhado ao explicar como a democracia iria promover os direitos fundamentais de liberdade, e os elevados ideais em tais circunstâncias. Nas democracias estabelecidas o eleitor vota de acordo com o desempenho dos partidos políticos - pelo menos é o que faz um número suficiente para alterar a maioria. Não é assim que acontece nos países mais multiculturais com um padrão fixo de votação segundo uma identidade cultural.

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Democracias não liberais estão emergindo como um híbrido estranho. À superfície eles parecem-se com as democracias, mas na realidade violam os princípios democráticos ao mesmo tempo que os direitos mais fundamentais de liberdade estão sob ataque e, em alguns casos, são praticamente inexistentes.

Há, no entanto, que fazer uma distinção entre as democracias não liberais em países próximos ou que pertencem ao círculo da cultura ocidental (vamos classificá-los de países monoculturas) e dos países fora deste círculo ocidental.

Para o segundo grupo de países, a democracia “iliberal” pode ser vista como um passo no desenvolvimento de um sistema político, seja ele a democracia ou qualquer outra coisa, e a tatear para encontrar a melhor maneira de lidar com os direitos fundamentais de liberdade tendo em conta os "constrangimentos" do multi-culturalismo. Em alguns casos, a situação dos direitos fundamentais de liberdade pode estar melhor do que há uma década ou duas.

Para o primeiro grupo de países, o quadro é diferente. Para eles, a democracia “iliberal” pode ser e muitas vezes é um retrocesso ao afastar a verdadeira democracia e tomar a democracia “iliberal” como um disfarce para a autocracia, ou a ditadura mesmo. Como a maioria destes países estão geograficamente próximos das democracias ocidentais, transformam-se em campos de batalha dos sistemas sociais, como é um exemplo claro a Ucrânia. Se a Ucrânia tem sucesso como uma verdadeira democracia combinando isto com prosperidade económica, a pressão sobre a Rússia e os seus líderes para mudar o sistema político vai aumentar. Se a Rússia conseguir evitar que a Ucrânia percorra este caminho, a pressão sobre um certo número de países da Europa Central e Oriental vai aumentar; as nações adjacentes a leste com um Estado nação muito menos liberal e com um sistema menos aberto não terão uma vizinhança agradável.

Infelizmente para as democracias ocidentais, especialmente para o Congresso dos Estados Unidos, um novo fenómeno, que pode ser rotulado de democracia oligarca e que consiste em pedir dinheiro emprestado ao exterior, está a ganhar terreno.

Os lobbys do petróleo, gás, telecomunicações e do sector financeiro entre muitos outros, tornam muito difícil (ou impossível) aos eleitos não ceder às tentações da corrupção.

É preciso uma grande dose de optimismo para sustentar que, em tais circunstâncias o sistema político e os políticos individualmente conseguem desvincular-se da influência exercida pelos próprios doadores e lobistas. Isto questiona o próprio carácter esperado duma democracia representativa liberal , para que possa reflectir sobre os vários  estratos sociais da população excluindo o factor dinheiro.

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A xenofobia embora de uma forma mais branda é cada vez mais difundida e subrepticiamente arrasta-se na agenda política como algo que todo mundo sabe, mas poucos admitem. É cada vez mais difícil entrar noutros países para trabalhar; vários países estão a introduzir esquemas que exigem prova de que um nacional não pode desempenhar uma função antes de admitir um estrangeiro, segundo, limites de quotas.

A principal preocupação num sentido "filosófico" é a aceitação tácita de que os seres humanos não são todos iguais. Em termos gerais, até há uma década atrás, parecia que o mundo estava a caminhar na direcção da igualdade, mas as restrições em matéria de imigração e de autorizações de trabalho podem ser os primeiros tiros num conflito que se aproxima, centrado em valores de discriminação dos seres humanos de acordo com a cultura, raça e religião.

A história fornece-nos exemplos (por exemplo, o período entre as guerras na Europa) que quando esta porta se abre, independentemente da forma como isso acontece, assiste-se de seguida à escalada da discriminação aberta que justifica a opressão e a crueldade que pode ser seguida ainda por maus-tratos. Quem está no poder (talvez uma maioria) sente-se no direito de adoptar tais políticas, porque não consideram as outras pessoas como seus iguais. Muitos alemães que, em 1930, nunca teriam pensado matar judeus fizeram isso dez anos mais tarde, sob o pretexto de que os judeus não eram seres humanos iguais a eles. Nunca se consegue ter um pé firme numa encosta escorregadia!

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A elite contra a maioria. Os valores usados por um número relativamente pequeno de seres humanos - os estratos superiores duma elite bem-educada que possuía uma comunicação facilitada numa língua franca, comum entre os membros deste grupo selecto. Tudo isto mudou com uma velocidade exponencial ao longo do último quarto de século.

A elite global adoptou a língua Inglesa como língua global e comum, mas essa elite ainda pensa e age de acordo com a sua cultura original, dando à mesma palavra significados diferentes. Uma linguagem comum em detrimento de uma língua franca!
A cultura anglo-americana não pode reinar supremamente por mais tempo; outras culturas e religiões reapareceram da hibernação.

Valores e partilha de valores através das fronteiras saiu fora do controle da elite; milhões, talvez até mesmo milhões de pessoas usam redes sociais para contestar os valores reinantes e o papel da elite. A comunicação global ocorre em níveis distintos com insiders (a elite) e os de fora (a maioria) que comunicam de forma independente. Na perspectiva de longo prazo esta divisão como uma ameaça à globalização ofusca a desigualdade económica. Pode não ser politicamente correcto dizer isto, mas a não elite não tem a mesma origem e educação; Tende a ser mais nacionalista e menos interessado em muitas facetas da globalização. A não elite actua mais pela intuição e responde automaticamente por emoções e "valores próximos a mim", fazendo dos seus membros presa fácil à sedução, apoiando decisões rápidas e favorecendo soluções de curto prazo muitas vezes à custa de "outros". Eles são menos críticos e mais emocionais. A maneira mais demorada e trabalhosa do processo da racionalidade e da lógica, aplicando a análise crítica herdada do Iluminismo, é posta de lado.

Isto pode não ser totalmente novo, mas a escala é. Lições da história e o que temos visto ao longo do último quarto de século indicam que a elite é capaz de lidar com estes movimentos, desde que a economia esteja boa, haja confiança no modelo económico e que o sistema político esteja bem considerado - em suma, a elite produz resultados.
Mas isto é precisamente o que foi perdido ao longo dos últimos 10 ou talvez 15 anos, em que o "modelo global" não produziu, tendo enganado os eleitores contornando a verdade, perdendo credibilidade no processo, e muitos situações que geriram foram de mal a pior convidando o pensamento alternativo a surgir à superfície.

A questão é se a civilização como a conhecemos pode sobreviver a uma transformação a partir dos valores estabelecidos por alguns (a elite) para um leilão global que oferece valores e percepções diferentes e muitas vezes em conflito entre si. Com sorte uma espécie de civilização global benigna pode emergir. A alternativa é o surgimento de conflitos e conflitos armados fora dos valores que justificam a violência contra aqueles que pensam de maneira diferente - o caminho mais fácil.

O poder do povo pode parecer maravilhoso, mas é perigoso esquecer que ele abre a porta aos valores mantidos sob controle, por uma tampa moldada por aqueles capazes e dispostos a incorporar repercussões de suas acções sobre os outros. O populismo espreita ao virar da esquina.

O filósofo holandês Baruch Spinoza, judeu Português, (1632-1677) ponderou sobre o seguinte dilema. A democracia é a mais razoável forma de governação; pois nela "cada um submete à autoridade o controle sobre suas acções, mas não sobre o seu julgamento e sua razão, ou seja, vendo que tudo não pode pensar da mesma forma, a voz da maioria tem força de lei." O defeito da democracia é a sua tendência para colocar o poder na mão de medíocres; e não há maneira de evitar isto a não ser limitando o exercício do poder, a homens de "habilidade treinada". Números só por si só não podem produzir sabedoria, e podem conduzir ao topo as maiores grosserias e bajuladores de favores. "A disposição inconstante da multidão quase conduz quem tem experiência, ao desespero, pois são regidos exclusivamente pelas emoções, e não pela razão."

Assim o governo democrático torna-se uma procissão de demagogos de duração breve, e os homens de valor são relutantes em fazer parte de listas onde eles devem ser julgados e avaliado por seus inferiores. Mais cedo ou mais tarde, o homem mais capaz rebela-se contra esse sistema, ainda que estejam em minoria. "Por isso eu acho que é então que as democracias se transformam em aristocracias, e finalmente em monarquias"; na últimas as pessoas preferem a tirania ao caos. Igualdade de poder é uma condição instável; Os homens são por natureza desiguais; e "Aquele que procura a igualdade entre desiguais busca um absurdo."

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Um novo sistema. O mundo está a passar por uma dessas fases raras, mas tumultuosas em que é incapaz de acomodar mudanças na ordem existente. Possivelmente, a idade da economia será relembrada como um interregno que permitiu a construção da fundação materialista para a humanidade iniciar uma época de valores não materialistas, como foi o caso de muitas culturas antigas. Se assim for, não é realista que a mudança venha a emergir nos EUA, por estarem tão comprometidos com o pensamento económico.

A ressurreição dos valores asiáticos adormecidos ao longo dos últimos 250 anos - na verdade culturalmente oprimidos e ocupados por valores ocidentais - pode acontecer. Religiões asiáticas e filosofias podem oferecer uma alternativa ancorada numa visão dum mundo menos materialista, com melhores e mais profundas interacções entre o reconhecimento de Deus, a natureza e os seres humanos, e um papel mais forte para o colectivo em relação ao individual. Em alguns, talvez até mesmo muitos aspectos, os valores tradicionais asiáticos representam o oposto do sistema de valores anglo-americanos. Um exemplo disso é a baixa classificação na hierarquia do comerciante tradicional chinês e do alto escalão do agricultor. O dinheiro não exerceu influência da mesma ordem como no caso nos países industrializados da sociedade.

Essa nova visão de mundo depende muito primeiro lugar da capacidade dos países asiáticos de reforçarem a confiança mútua e em segundo lugar da vontade para liderar.

A reconciliação entre a China e o Japão é o primeiro passo; caso contrário, a animosidade entre os dois países irá funcionar como um impedimento. China e Índia precisam de se aproximar e colaborar. Uma compreensão mais profunda dos valores comuns é imperativa. Na Europa, o cristianismo, apesar das suas várias edições, serviu esse propósito, mas não existe uma filosofia semelhante à mão na Ásia.

História da Ásia e, em particular, a história chinesa revela uma falta de ambição de liderar e oferecer o seu modelo ao exterior - a Grande Muralha irradia psicologia chinesa. Parece haver uma espécie de inibição na liderança cultural quando ela é confrontada fora da própria esfera, que pode bloquear qualquer "globalização" de valores asiáticas. Obviamente, outra maneira disso acontecer é outras culturas serem atraídas pelos valores da cultura asiática – mas disso ainda não há sinais.

É da responsabilidade da Ásia dar o primeiro passo e avançar. Sem muita dúvida, muitos valores tradicionais asiáticos - filosofia e religião - ressoam bem com as questões das tendências subjacentes emergentes por todo o mundo da economia. Até agora a Ásia tem comprado modelo ocidental o que lhe tem servido como  plataforma para um crescimento económico rápido. O consumismo é visível em muitos países asiáticos. Um investimento enorme em infra-estruturas também está na agenda. Isto não pode, no entanto, ser visto como a Ásia a comprar no mundo anglo-americano da economia. Construir infra-estrutura física e capacidade de produção e consumo é necessário para depois moverem-se para uma era além da economia sob a forma duma era de não economia onde outros valores se destacam. Sem satisfazer as necessidades básicas com um tal salto isto não será possível.

Se a Ásia não responder a este desafio, temos de olhar para duas alternativas.

A primeira delas é um mundo dividido em que a globalização gradualmente dá lugar a um regionalismo com  valores ocidentais, valores asiáticos e valores similares definidos por culturas ou geografia. Samuel Huntington falou sobre um choque de civilizações, um modelo com visões de mundo divergentes, mas viável no interior da economia global em funcionamento, embora menos forte e menos consistente do que o que vimos e fomos levados a acreditar continuaria. Seria gerenciavel  Qual seria o governo global não está claro, mas não é isso que temos visto ao longo dos últimos dez anos? Talvez nós já estejamos lá!

A segunda é cair no abismo de uma nova Idade das Trevas, onde o nacionalismo, o populismo, a xenofobia governa a ordem do mundo, numa combinação sinistra de fanatismo, ignorância e anti-ciência.

Irrealista? Não. Isto é o que aconteceu várias vezes na China, com dinastias colapsos vazio de caos a ser seguido por precisamente tais valores. O Império Romano foi sucedido por mais de 600 anos de espera até a Renascimento surgir a partir da idade das trevas.

A observação assustadora é por mais que nos seja repulsivo concluir a maioria dos sinais indicam o último cenário o mais provável com muitos de nós sem perceber isso e muito poucos dispostos a agir com intenção de impedi-lo.

traduzido daqui por Dumoc
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Joerg Oerstroem Moeller é pesquisador visitante sénior do Instituto de Estudos do Sudeste Asiático em Singapura; Professor Adjunto da Universidade de Administração de Singapura e Copenhaga Business School; e um Ex-aluno Honorário da Universidade de Copenhaga.

[1] Aqui resumida por Will Durant, The Story of Philosophy, Spinoza Capítulo IV.













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